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terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Perder-se por adivinhar



Não tinha como saber, mas dali a algumas horas, tudo o que havia desejado com o desespero de quem fica para trás esquecido havería de se concretizar.
Antes não o tivesse escrito. Na fúria riscada das letras entre as lentes muito aumentadas de lágrimas que primeiro tentou conter, depois pingaram para o papel, depois mastigou à medida que tudo lhe saiu na tinta da raiva, em golfadas, no despejo do alivio como quem já não tem nada a esconder, a perder por perdido por a terem perdido para trás, esquecida.
Um pedido de desculpas tornou-se numa carta de demissão.
Despedia-se, largava tudo, deixava-os, que fizessem o que quisessem, agora haveriam de ver como era importante o apagado lugar que ocupava, os passos minúsculos e silenciosos que ninguém se apercebia, o chamamento que ninguém haveria de atender.
E no ímpeto da revolta deixou-se levar.
Contou do sigiloso das reuniões, dos segredos que escutava a meia-porta, do que pensava de todos eles e de cada um, de si e de como a deixavam para trás, humilhações, ignorâncias, gritos, deshoras.
Amachucou as folhas e deitou as mãos ao rosto.
Adormeceu cansada e cheia de pesadelos.
No dia seguinte foi chamada ao gabinete e dispensada por excesso de pessoal.

 

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