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sexta-feira, 3 de julho de 2015

Só e amparado


 
O egoísmo das letras conjugado à necessária solidão empresta ao actor companhia e amparo, este acaba assim por ser, autor de sua [outra] própria personagem, a estória dentro da história, o observado a olhar para o observador e este, acariciado ou esmurrado pelo destino que atribuír aos que dá vida confronta-se no papel de juíz e deus, escorregando o xaile do aconchego e a rede de protecção.
Mas enquanto se constrói, se flutua no verbo a desenvoltura das palavras para dizer cores e cheiros, transmitir a raiva da traição ou acender o diálogo prolongado entre falas altas e apenas sonoridades que equivalem à elaboração de uma resposta, tudo é companhia, uma proximidade que aquece e isola o resto [dos outros], lembra remotamente para além dos que os escreve, felizes transeuntes que falam em alimento e que dão bom dia ao acordar no lado certo da cama.
Na sentença do fim, a aflição dupla: querer acabar e não querer acabar.
Porque a toxicidade é também a consciência de que o verbo, poético porque necessário na dose certa, tem de ter o seu términus, sufocações de um abraço demasiado apertado, demasiado tempo, demasiada liberdade para outras palavras que se pedem para escrever.
Ou porque o homem tende a suspirar pelo que o resguarda e encanta e adiando o fecho, aninha-se ao consolo ilusório do poder de protegido pelas páginas cheias, decadentemente poderoso para só ele ter o tempo de matar o fim.

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