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quinta-feira, 28 de maio de 2015

Serrotes



Convidam-me a sentar, levam-me a uma poltrona de veludo extremamente confortável conduzindo-me pela ponta dos dedos onde esperam que eu me ajeite. Sinto-me bem, aguardo uma surpresa.
Ouço ao longe um som fino de violino que se vai tornando forte acompanhando a percepção da imagem que distingo. Outros vão surgindo na sua cauda, engrossam-lhe o som, desconheço a melodia mas é tão bela que hesito em fechar os olhos ou permanecer com eles abertos para não perder nada do que se me oferece. E à vez aquele solo perfeito de violino atinge-me no peito e acelera o coração, pede o coro dos demais, emociono-me e sinto a garganta apertada quando todos emitem em harmonia uma música que me impele a erguer, caminhar na sua direcção, querer fazer parte daquelas notas.
Nesse instante, silêncio, um rosto conhecido sai daquele conjunto impoluto e andando para mim deslizando o arco nas cordas arranca um ruído de arame a ser raspado com uma faca de serrilha.
Os restantes violinos estáticos.
Ouço o meu coração a galopar. Tento achar alguém que me olhe nos olhos.
De novo o som do serrote e mais alguns passos para mais perto de mim. Grito não, não quero, não sabes, nunca soubeste, nunca irás aprender, bato com os pés na esperança que o susto empurre o aprendiz para um retrocesso invisível até ao desaparecimento total.
Silêncio.
Regresso à minha poltrona de veludo sozinha.
Todos os violinistas tocam de novo. E malfadadamente o serrote também.

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