Como qualquer criança inventei as minhas estórias e pu-las na boca das minhas bonecas, fiz chazinhos e comidinhas e servi-os na companhia de imaginários convivas que permaneceram visita do meu quarto por longos anos, muito para além da vida das bonecas, cresceram comigo, perderam-se no mundo e de quando em vez regressavam à minha memória.
Não sei quem sería eu hoje se o verbo não me tivesse achado. Ou ao contrário, porque as palavras embora sempre tivessem estado para mim, ali, presentes em todo o instante, eu só me encarava a sério na dança. E o uso da escrita, dos eus de mim que já não eram mais meus, mais não era do que uma espécie de cegueira ao que se passava, esse acto leviano e quase diário da escrevinhação que eu tomava como natural, encolhía os ombros e atirava para o lado, dançava.
Um dia acabou e ficaram as bonecas. As folhas soltas mas também os cadernos e ainda os de estrear. Regressaram as conversas de quarto de criança, já maduras, muito crescidos (quase) todos eles, trouxeram outros e outras, mas nem todos deixei entrar na minha vida. Aos poucos entendi os pés a aquietarem-se, as mãos num turbilhão, o ritmo do coração disparado como no palco.
Continuo sem saber a resposta à minha própria pergunta. Talvez não deva saber, basta o bater do coração para a fazer esquecer.
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