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sábado, 20 de dezembro de 2014

Arrumações



Mastigou a côdea, fechou os olhos. Porquê vir-lhe à lembrança agora àquela hora semelhante figura estorvando-lhe o sossego da manhã, um fio de sol a brilhar nos azulejos da cozinha, tudo tão calmo e do nada aquele soco no estomago que lhe fez subir a manteiga com gosto de ranço e o pão abolorado num passado cozido a uma outra que não ela, essa havia-a enterrado e rido. Apertou os olhos com força e disse uma palavra grosseira. Enfiou os dedos no cabelo e esfregou a cabeça com força para a frente e para trás, repetiu mais duas vezes a mesma palavra.
Ele apareceu mais vivo, mais colorido. O som da voz nítido a ecoar pelos azulejos e a abafar a luminosidade do dia, uma pequena gargalhada, uma estúpida e pequena gargalhada ela achou.
Abriu os olhos, bebeu o café de um trago, recordou-se do jeito de ele pegar na chávena nunca usando a asa e queixando-se sempre que estava quente, chamou-lhe idiota e atirou com a louça a um alvo invisível, partindo-a, correu para o quarto e desfez a cama, apontou para o monte da roupa e contente, disse que era feliz por nela ele nunca ter passado uma noite inteira e de seguida, pulou, pulou e saltou para cima do colchão e ofegante caiu de bruços.
Acordou já a tarde se tinha aprumado.
Arrumou tudo, varreu os cacos, fez café fresco. Na tranquilidade da cozinha veio-lhe à lembrança a fúria que tinha sentido. E riu baixinho.


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