Já sentimos, já cortou, já sangrou até parecer secar e nunca mais voltar a doer com tamanha intensidade como dessa vez. Mas volta, e maior, mais profunda e dilacerante até rachar um meio que não nos adivinhávamos parecendo que não há cola que junte os bocados e o faça um inteiro. Mesmo que todos digam numa experiência semelhante que tudo passa, que o tempo lixa os rebordos da cicatriz, afaga as imperfeições da dor e depois, bem depois... é um espinho que custa quando se engole a saliva ao tentar falar-se dos que se perderam e fere devagarinho sem se ver.
Ao longo da vida levamos com as machadadas da ausência dos que se amam, ficamos amputados no peito, pedaços do coração à deriva digeridos no sal das lágrimas e enterrados com eles. E depois, há ainda a réplica de vivermos a dor da morte dos outros que não são nossos, escutarmos a saudade, o movimento de caracol do queixo ao peito e joelhos dobrados como se se quisessem engolir a si mesmos na esperança de fazer desaparecer o insuportável. Aí, revivemos a lembrança da nossa muito privada memória, comparamos e dizemos que nada é semelhante à nossa.
Quantas vezes fenecemos até o corpo viajar, largado, um invólucro inerte, carregado no universo, sem som nem vestigio de companhia...
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