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sábado, 11 de outubro de 2008

Contos Curtos Quase Escuros - A janela

- Está frio... Fecha a janela.
Ouvia-a. Distintamente. Mas não fechou a janela, precisava daquele ar frio e com cheiro de molhado a arrepiá-lo no tronco nu e a esvoaçar um pouco as cortinas leves. Cada vez era mais intenso. O frio por dentro. Como se o fabricasse para se manter imobilizado no disparo do que evitava fazer, cada vez mais forte, mais presente e mais ruidoso. Cada vez sentía mais frio por dentro quando se deitava ao lado dela ou quando já não era capaz de abrir os olhos e vê-la por baixo de si e as palavras murmuradas na ponta dos lábios eram só uma lembrança do que já não conseguía dizer.
- Não ouves? Está frio, fecha a janela por favor.
Se fechasse a janela abriría a porta, o frio estalaría. Deixaría um rasto de bocados do que pretendera ser e um caminho de chamas faría que se pusesse a correr desenfreado no receio de o chamarem e ele, mais uma vez hesitante, voltaría atrás, voltaría nas desculpas de algum engano que lhe parecera real e de novo o frio, apagado o incêndio sem rescaldo. Por isso congelava-se, hirto no que tinha de ser, acoçado no silêncio.
- Se não fechas a janela vou eu aí fechá-la! Não sentes como está frio?
Não. Sente o frio mas não quer que ela venha. Ainda não. Ainda não é capaz. Talvez quando chegar a Primavera. Lá não dói tanto, agora no Outuno sería terrível. Não para ele que já se acostumou, precisa deste gelo a dominar-lhe a acção, a cabeça. Enquanto tem cabeça ainda pode abrir e fechar a janela. Depois não há-de querer saber de mais nada, chega-lhe agora ter de saber de tudo, do frio, do calor, de janelas abertas e portas fechadas e dela.
- Não fechaste a janela... e eu pedi-te. Vou-me embora.
Fechou a janela. Cerrou nas vidraças o reflexo do seu tronco nu e gelado. E também o dela no dia em que ela fez da janela a porta de saída.

14 comentários:

Anastácio Soberbo disse...

Olá, gosto do Blogue.
É bonito e bem feito.
“Quem corre por gosto, não cansa”.
Parabéns!
Saudações de,
Soberbo

O QUATORZE disse...

Boa Noite
Tenho que ler por vezes os seus textos mais do que uma vez para entender,ah ah ah.
Amizade
LUIS 14

SONY disse...

Gas,

revejo-me aqui:"Sente o frio mas não quer que ela venha. Ainda não. Ainda não é capaz."

Parece contrária esta posição ao que sinto hoje, mas a verdade é que já vivi um pedacinho assim!

Há coisas! vida matreira esta!

um beijo,
sony

casa de passe disse...

sinceramente, não consegui ler.
tenho tido poucos clientes e não consegui arranjar dinheiro para comprar uns óculos com lenntes progressivas.
estes que trago, comprei-os num chinês, em Benfica.

Mas, calculo que seja muito interessante.

LOULOU
(sem a beata da Nini, sem a Alice, sem o Avô e sem o safado do João)

Ema Pires disse...

Um texto, como sempre, sutil e lindamente escrito com esse teu talento querida amiga de fogo.
Tenho estado fora e com pouca vontade de ler e escrever.
Hoje deixei um poema africano no meu blogue, sobre a vida e a morte que a mim me pareceu lindo e muito especial.
Beijinhos amiga

Mateso disse...

Por ora não comento. Fá-lo-ei depois. Apenas para dizer que há uma pequena lembrança lá pelo meu azul.

Gasolina disse...

Anastácio Soberbo,

Olá!

Ainda bem que gostaste desta Árvore. Já tinhas gostado da 1ª vez que cá vieste, assim o dizías.

Obrigado, regressa quando te aprouver.

Gasolina disse...

Luís XIV,

(Olha lá agora tratas-me por você?)
(Que punhos de renda!)

Então porquê???
Por acaso já me disseram que cada vez escrevo mais hermético...

(Risos!)

Ficai bem, D. Luís XIV

Gasolina disse...

Sony,

Prepara-te.
Estás a crescer para dentro.
E olha que de vez em quando dói...

Um beijo Formiguinha

Gasolina disse...

Casa de Passe,

Cara Loulou,

Não admira que tenha poucos clientes. Com essa miopia galopante não há binóculos que lhe valham.
E eles a passarem-lhe adiante do nariz...

Faça uma pausa na actividade e pense em si, submeta-se a uma cirurgia.
Vai ver que vem de lá a ver o mundo com outros olhos.
E se calhar até o João.

Beijos às Meninas

Gasolina disse...

Ema,

Fico sempre feliz de te ver ao pé da Árvore. Tu significas uma outra tão mais sábia e valente que esta.

Quanto ao poema que tens no teu Baobab, basta que o digas: é para mim selo de qualidade.
Lá irei.

Um beijo e saudades da tua voz Amiga de Fogo

Gasolina disse...

Mateso,

Lembrança?
E há lá maior lembrança que as tuas palavras?!

Irei sim, com muito gosto, ler-te e claro (não o escondo), matar a curiosidade.

(Este maldito tempo amedronta-se por entre os meus dedos...)

Um beijo para o teu Azul

ASPÁSIA disse...

AMIGA!!!

ANTES FAZER JANELA DA PORTA, QUE PORTA DA JANELA....

SE CALHAR A RAPARIGA TAMBÉM COMPROU ÓCULOS NO CHINÊS COMO ESSA SENHORA DE CIMA E ENGANOU-SE - SAIU PELA JANELA EM VEZ DA PORTA!

NÃO PODES ACRESCENTAR UM P.S. DIZENDO - ELA ERA PÁRAQUEDISTA ??

BEIJOCA DO PORTÃO DO JARDIM...

Gasolina disse...

ASPÁSIA

(FAZES-ME RIR, AHAHAHA)

NÃO, NÃO, ACHO QUE QUEM PRECISAVA DE ÓCULOS ERA ELE, QUE ELA JÁ TINHA "VOADO"...


AH, ACRESCENTOS É QUE NÃO VAI DAR... OU SERÍA UM CONTO CURTO QUASE CLARO...

JUNTO AO TEU PORTÃO E AOS TEUS CANTEIROS UM BEIJO PARA TI, JARDINEIRA